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segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Espancamento



Bateu-lhe uma ideia, mas bateu com tanta força que ele não sobreviveu.

domingo, 14 de setembro de 2014

O gato


                  Matou o gato sete vezes e ele reapareceu. Não sabia, mas o gato era inglês.

Residência


 Minha casa, meu corpo. Dele, só saio morto.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

O não conhece-te a ti mesmo

                                                                (Imagem: google.com)
         
   Ele não sabe, mas o lobo que mora nele, aos poucos devora seu corpo de cordeiro.

sábado, 5 de julho de 2014

O mendigo e o cão



             O mendigo abana o cão para espantar-lhe as moscas da ferida. O cão, em resposta, abana-lhe o rabo. Eles não se abandonam.

Poesia plena



Quando o sentir preenche o momento,
chora a palavra
chora o escrevedor de versos.

E eis que surge a poesia,
dissociada de qualquer representação
vibrando a sua maneira
mais genuína.

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Na esquina


             A filha já não lhe dava mais nenhuma atenção. Tentou falar com ela mas ouviu um sonoro: "vai ver se estou lá na esquina!".
             À noite, quando voltava do trabalho, avistou-a. Estava linda, de mini-saia, salto alto e bolsa pendurada no ombro. Era a mais linda daquela esquina.

sexta-feira, 30 de maio de 2014

Noite cinzenta


         Debruçado no parapeito da sacada de seu apartamento, Caio vê os pequeninos carros que lá embaixo passam como vaga-lumes. Do canto de um de seus olhos brota uma lágrima que percorre sua face. Pouco a pouco ela vai se desprendendo de sua pele, até se lançar daquele vigésimo quinto andar e explodir no asfalto.
            A sacada é pequena e mal-iluminada. Uma leve brisa joga os seus já grisalhos cabelos na altura dos olhos, ofuscando-lhe parcialmente a visão. Caio está só, apenas o silêncio e a solidão acompanham-no.  Do bolso esquerdo tira um isqueiro e acende o último cigarro. A fumaça logo se junta à noite cinzenta.
            Não sabia dar nome ao que sentia. Talvez fosse a meia-idade batendo-lhe à porta e trazendo-lhe o exame de consciência. Não que tenha cometido muitos delitos no decorrer de sua vida, suas faltas foram aquelas que abrangem a maioria dos homens, foi infiel no casamento, tornou-se um pai ausente e após o divórcio voltou à vida de solteiro, passou a sair com os colegas de trabalho, exagerava na bebida e segunda-feira dava início a mais uma árdua semana. Agora nem isso ele tem mais, aposentou-se há alguns meses e os amigos há tempos não os vê.
            Semana passada foi seu aniversário, o celular não tocou nenhuma vez durante todo o dia. Foi a primeira vez que sua filha não lembrou da data, talvez tenha lembrado mas não quis ligar. Naquele dia percebeu que o pequeno apartamento havia se tornado grande demais para ele. Paredes compridas, cômodos amplos e vazios de móveis pareciam inclinar-se sobre ele. Por isso preferia a pequena sacada onde ele se encontrava agora e onde passava a maior parte do tempo.
            O cigarro consumia-se quase que sozinho. Quando Caio deu-se por si, percebeu que desperdiçara várias tragadas. Não podia fazer mais nada a não ser atirar aquela ponta de cigarro edifício abaixo. Observou a pequena chama riscar lentamente a escuridão da noite. Achou-a bonita. Pena não ter outro cigarro para acender. Procurou no céu estrelas e não as encontrou, olhou para o horizonte e não viu a lua. O céu era uma imensa massa cinzenta.
            Voltou-se para si, não tinha sono. Um arrepio passou-lhe pelo corpo. Não era inverno. O clima era ameno, característico do outono. Mesmo assim encolheu-se, suas mãos tremiam. Parecia que dentro de si havia uma vontade a qual ele tentava conter a todo custo. De repente segurou com as duas mãos no parapeito da sacada e com um só impulso deu um salto, de modo que, com o apoio das pernas, equilibrou-se e conseguiu ficar de pé. Abriu os braços e um sorriso. Sentiu o vento soprando sua face e esvoaçando seus cabelos. Os longínquos sons de buzinas  e de automóveis em constante movimento chamaram sua atenção para baixo. Olhou e viu novamente os vaga-lumes e encantou-se com a feérica dança das luzinhas frementes. Seus olhos cintilavam. Neste instante o interfone tocou, mas ele sequer ouviu. Ele estava inebriado perante a cena que se lhe mostrava. Uma súbita vertigem tomou conta de si, uma de suas pernas falseou, sentiu o peso de seu corpo desprender-se de si e riscou lentamente a noite cinzenta.




sexta-feira, 25 de abril de 2014

Açougueiro

  (imagem via google)


Escolhi a carne. Sim, a gente é feito de quê? Não há para o ser humano coisa mais íntima, principalmente quando se trata de seu próprio corpo. Há quem diga que sente asco e nojo. Pura bobagem! É claro que contemplá-la assim, em cima desse balcão, toda ensanguentada e picada, pode não ser lá muito agradável para os olhos de muitos.  Mas é assim que deve ser, sangue e carne andam juntos. Perguntaram-me certa vez: você não escolheu ser açougueiro, escolheu? Escolhi sim, respondi. Herdei do meu pai não só este açougue mas também a aptidão plena para exercer o ofício de açougueiro. Para mim carne é o que há de mais importante,  é dela que vem o gosto, o cheiro, a textura e a forma de cada um. Ela me deu tudo na vida, criou meus filhos, sustentou minha família e  nos regou com certas regalias. Foi assim também com meu pai e o pai do meu pai.  A carne nos deu dignidade, por isso a trato com muito respeito e até com carinho. Para aqueles que têm repulsa, eu respeito mas não entendo. Como se pode tratar com repulsa algo que em ti pulsa?
Esta faca pontiaguda que trago na mão é meu instrumento de trabalho, dela não largo. Mantenho-a afiadíssima. O corte tem de ser perfeito, a carne merece respeito. Olha que bonito moço, passada a faca quanta fibra fica, essa cor vermelha vibrante, o cheiro é inebriante. Sei que tem gente que prefere não comer, que tristeza! Somos carnívoros, é a nossa condição, nossa natureza. Pior do que não degustar carne é maltratá-la. Vejo muita gente dilacerando o corpo, pra isso já basta o tempo que nos rói segundo a segundo.  Às vezes é simples descuido, outras falta de amor para consigo mesmo. Contudo algo é certo, carne foi feita pra usar. Quanto desperdício por aí, quanto pedaço de carne que perambula pelas ruas sempre no resguardo. Conheço um monte. A porta do açougue não deixa de ser também uma janela, uma janela para o mundo. Não adianta moço, o povo diz e é verdade, mais dia menos dia a terra vem e come, consome, o corpo some. Carne também exige ciência, usa mas não abusa e se puder lambuza.
Você já deve ter percebido que esse é um assunto que muito me apetece. A gente é assim, gosta de falar sobre aquilo que conhece, pelo menos é assim que deveria ser, não é? Nunca tive muita oportunidade de estudo mas sei como ninguém a maneira de tratar um naco, fazer um lanho, uma vida inteira dedicada à carne. Não me faz falta nenhuma papel de diploma pendurado aqui na parede. Mas se tem uma coisa que me deixa triste é quando penso que tem gente que sonha em comer carne, e fico mais triste ainda ao pensar que alguns morrem sem comer um pedacinho sequer, sem sentir aquele cheirinho de um bom bife ardendo na frigideira. Judiação pura! O churrasco, por exemplo, é uma das maiores afirmações da nossa condição, o cheiro que faz a gente salivar, é melhor nem falar. Privar alguém desse prazer só pode ser coisa de quem não tem o coração feito de carne.  E não há coisa mais linda que uma carne de moça no auge de seu vigor. Moça nua despe-nos de qualquer palavra. Já imaginou paixão sem carne? Impossível! A vida acontece aqui na nossa frente. É assim que eu vejo, vejo com esses olhos feitos também de carne. Espírito nunca vi nenhum. Acho que ninguém nunca viu. Quem sabe do real valor da carne não tem tempo pra perder com essas coisas. Se a gente se pega a pensar em disparates de outro mundo perdemos o esplendor maior da carne. Carne é igual fruta, tem época certa. Aproveitou? Fez bem. Caso contrário o desejo fica latente lá latejando, e o arrependimento por não ter desfrutado deixa a saliva amarga moço, um amargor que nem suco de fruta madura e doce adoça.

Quase meio-dia já, o corpo, que de carne é feito, carne pede. E aí seu moço, já escolheu a carne que vai levar pro almoço? 

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Estripador apaixonado



Fez das tripas dela coração.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Palavra muda


(imagem via google)

Palavra muda
de cor, significado e grafia.

Palavra muda
espera
que a língua venha,
a toque 
e lhe dê o sopro
da vida.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Sol


(imagem via google)


O Sol não nasce
a léguas de distância
nasce aqui
bem em frente a minha janela
sempre
feito um girassol
rodopiando em raios luminosos,
pinceladas de Van Gogh.

sábado, 25 de janeiro de 2014

Encantamento



                                             - Quem pintou seus olhos de azul?

sábado, 18 de janeiro de 2014

Dança


(imagem via google)


                           Quando dançava, os movimentos de seu corpo riscavam o universo.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Ardência



(imagem via google)


                  Seu corpo era um cigarro que ardia em sua boca e alimentava seu vício.

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Talvez



Talvez
não seja,
se a tal
da vez
vez não for
vez nenhuma.

sábado, 4 de janeiro de 2014

Folhas


       Preferia o livro impresso. Dele tinha o frescor e o aroma das árvores em suas mãos.